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Governo de São Paulo raciona a água e anuncia mais restrições

Sabesp diz que rodízio não está descartado e presidente pede preparação para o "pior"

María Martín
Imagem do reservatório do Cantareira em julho de 2014.
Imagem do reservatório do Cantareira em julho de 2014.Fernando Carvalho

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e a Companhia de Saneamento Básico (Sabesp) admitiram pela primeira vez, após um ano de crise hídrica com eleições no meio, que o Estado sofre racionamento de água e que a situação vai piorar. O novo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, já pensa na possibilidade de um rodízio na capital: "Pode chegar [a ter rodízio]. Torcemos [para] que não". O executivo anunciou também que a companhia já ampliou o tempo de redução da pressão da água, uma prática não reconhecida até hoje, mas que há meses deixa sem abastecimento durante horas milhares de pessoas, especialmente os moradores de locais mais altos. Kelman admitiu que a iniciativa vai deixar sem água ainda mais pessoas. “Temos que estar preparados para o pior”, repete o executivo desde que foi eleito.

Enquanto Alckmin afirmava literalmente que o “racionamento já existe”, Kelman especificava que, para falar tecnicamente o termo, a restrição deveria afetar toda a população, o que ainda não acontece. Kelman reconheceu que um cidadão que fica seis horas sem água já sofre, efetivamente, um racionamento.

O governador de São Paulo durante a campanha eleitoral, em 2014.

Esse racionamento, consequência da redução da pressão da água, já enfrentado por uma parte da população, era chamado até hoje de “trabalhos de manutenção". A ampliação do tempo de menor pressão da água distribuída pode afetar mais de 1.200 bairros de 37 cidades do Estado, incluindo a capital, segundo uma lista que a Sabesp foi obrigada a publicar por determinação da agência reguladora estatal Arsesp. Na avenida Ipiranga, no centro da cidade, um condomínio já informava aos vizinhos da nova realidade: “Comunicamos a todos os moradores que racionamento de água feito pela Sabesp é das 18h às 7H. Decorrente deste racionamento, a entrada de água não é suficiente para enchermos as caixas de água [...]".

“Esta nova postura, mais alinhada com a realidade, infelizmente demorou muito em acontecer. Chega em um momento de extrema gravidade dado que as chuvas não foram como se esperava e é muito provável que 2015 seja bem pior que o ano passado”, lamenta Marussia Whateley, coordenadora do Programa Mananciais do Instituto Socioambiental (ISA).

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A onda de sinceridade dos responsáveis do abastecimento de água no Estado vem depois de uma liminar da Justiça que suspendeu a sobretaxa de até 100% para quem exceda em 20% o consumo médio registrado entre fevereiro de 2013 e janeiro de 2014. A juíza não discorda da medida, mas exigiu que a declaração oficial de racionamento aconteça por meio de um decreto, uma medida apoiada pelas associações de consumidores e pela Ordem de Advogados do Brasil de São Paulo (OAB). O Governador conseguiu derrubar a decisão judicial em menos de 24 horas e negou que seja necessário um decreto. "Não tem que ter decreto. Isso está mais do que explicitado."

Ao reconhecer o racionamento, Alckmin colocou a responsabilidade na Agência Nacional de Águas (ANA) e omitiu alguns detalhes. "O racionamento já existe, quando a ANA determina. Quando ela diz que você tem que reduzir de 33 para 17 [metros cúbicos por segundo] no Cantareira, é óbvio que você já está restrição. O que estou dizendo é que se tirávamos 33 metros cúbicos por segundo [de água], e hoje estamos tirando 17, é óbvio que nós temos uma restrição hídrica".

Essa decisão, discutida em agosto e que começou a ser válida no dia 31 de outubro, não foi unilateral e foi tomada conjuntamente com o Departamento de Água e Energia Elétrica de São Paulo (Daee), responsável por autorizar as captações nos seis reservatórios estaduais.

A Sabesp, procurada durante todo o dia, não respondeu os questionamentos do EL PAÍS.

No começo da crise, no início de 2014, a negação de racionamento ou redução de pressão foi sistemática. O Ministério Público Federal em São Paulo chegou a recomendar ao governador e a Sabesp que apresentassem projetos para a implementação do racionamento de água nas regiões atendidas pelo Sistema Cantareira para evitar o colapso do sistema, mas a companhia descartou a medida. “Embora reconheça a importância institucional do MPF, com o qual sempre colabora, a Sabesp discorda frontalmente da imposição de um racionamento. A medida penalizaria a população e poderia produzir efeitos inversos daqueles pretendidos pelos procuradores", disse em julho a empresa. O próprio Alckmin disse em um debate eleitoral da campanha: "Não falta água, não vai faltar água em São Paulo".

Apesar das intensas chuvas de verão, cinco das seis represas do Estado registraram queda no volume de água. No Cantareira, que abastece 14 milhões de pessoas na Grande São Paulo e em 62 cidades do interior do Estado, o nível caiu pela terceira vez, de 6,4% para 6,3%. O presidente da Sabesp pediu aos cidadãos que rezassem para que São Pedro tenha algo mais de pontaria na hora de direcionar as precipitações.

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