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Os rituais dos guerreiros Xavantes

Para passar para a fase adulta, os meninos dessa etnia enfrentam uma longa batalha

Marina Rossi

Não são nem cinco da manhã na aldeia xavante de Nossa Senhora da Guia, a cerca de uma hora e meia de General Carneiro (MT), a cidade mais próxima da comunidade. Uma espécie de uivo coletivo é ouvido de um dos cantos da aldeia, mas ainda não é possível enxergar nada por causa da escuridão. É um grupo de adolescentes que se prepara para um importante ritual. Antes do sol raiar, os pais dos meninos Xavantes preparam seus filhos para um confronto chamado Oi’o, que significa ‘luta de raízes’. No meio da tribo, com toda a comunidade ao redor, os meninos se confrontam, para provar sua coragem e bravura.

A luta é parte de uma série de etapas que o garoto Xavante deve passar antes de chegar na fase adulta. Quando o garoto Xavante completa 10 anos, ele vai para uma casa afastada do resto da aldeia, chamada H’o. Ali, junto com os outros meninos da mesma idade, ele ganha um padrinho, que o ensina a caçar, pescar e a “respeitar os mais velhos para ser um adulto respeitado”, segundo explica Elias Tsirobo, irmão do cacique de Nossa Senhora da Guia. Nessa casa afastada, ele fica longe da família e de outras mulheres e só sai depois de cinco anos. A luta de raízes que acontece nesta manhã é um dos rituais pelos quais eles têm que passar ao longo desse tempo.

Devidamente pintados e adornados, os meninos, de três a 16 anos, se enfrentam de acordo com a idade. A luta ocorre com uma raiz, daí o nome do confronto. A pintura é parecida mesmo entre os clãs diferentes. O pai também faz um prepara com folhas e ervas para os meninos. "Não posso dizer do que é feita, senão os inimigos também vão fazer igual”, explica Elias Tsirobo. Segundo as crenças, é essa bebida que faz com que o menino fique forte o suficiente para ganhar a luta. Mulher grávida não pode ajudar a pintar os meninos. "Dá medo, covardia. Não é bom", explica Elias.

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O confronto tem regras. Dura alguns segundos, não é permitido atingir a cabeça e os pais interrompem a luta assim que o menino aparenta desistir, ou começa a chorar, o que é muito comum entre os pequenos. Uma única menina, de cerca de sete anos, entrou na luta naquele dia. E venceu. “Ela vai ser guerreira”, disse o pai da garota, Gutenberg Aiwede’wa Abho’odi.

As mulheres dessa tribo não têm longos cabelos até a cintura. Na cultura Xavante, sempre que um parente morre, a família toda – inclusive as crianças – raspam a cabeça, em sinal de luto e respeito.

Segundo a Funai, os Xavantes totalizam 28.000 pessoas hoje, espalhados pelo Estado do Mato Grosso. Eles são fortes e grandes e a maioria dos adultos fala português e se veste com roupas compradas na cidade.

Há uma alta dissidência de diabetes e obesidade entre os indígenas dessa etnia. Segundo explica Claudio Rodrigues, coordenador distrital do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), a alimentação é um problema para esses povos, que têm uma dieta baseada na comida que é vendida nas cidades. "A cultura da terra foi perdida. Então, eles não plantam mais nada, e comem a mesma coisa que o homem branco", diz. Para Rodrigues, é necessário que o Governo, mais do que prestar assistencialismo em forma de dinheiro, ensinasse novamente os indígenas a plantar e caçar. "O Governo deveria ensiná-los novamente".

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