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Coluna
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O que os pobres pediriam a Dilma se entendessem de economia?

Poderia parecer estranho, mas uma decisão como a nomeação do novo ministro da Fazenda ou da Educação poderia ser até mais importante para os pobres do que para os ricos.

Juan Arias

A presidenta Dilma Rousseff está recebendo de todas as partes conselhos e sugestões sobre como deveria alterar a política econômica que acabou com um rosário de índices negativos em seu primeiro Governo e com o temor de que possa surgir o temido fantasma do desemprego, que seria pior ainda que a disparada da inflação.

Dilma se reelegeu mais com os votos dos candidatos de baixa renda do que com os dos mais afortunados. O que lhe pediriam esses milhões de eleitores pobres se entendessem de economia? É muito provável que lhe apresentassem, paradoxalmente, as mesmas preocupações dos mais ricos, dos empresários, do mundo que produz e exporta.

Os integrantes dessa nova classe C – que não sabem o que é PIB, câmbio flutuante ou o famoso tripé econômico – seria os primeiros, se soubessem dessas coisas, a se preocuparem em conhecer o nome do novo ministro da Economia. Estaria essa nova classe C preocupada em saber se a nova presidenta vai deixar a inflação correr solta e se os juros vão continuar subindo.

Se tiver conhecimento de como essas possíveis mudanças podem afetar concretamente o seu cotidiano, ou da tortura que implica ter que se endividar em bancos para manter o que já foi conquistado, eles estariam mais preocupados com essas mudanças na economia do que com a reforma política ou com o uso de plebiscitos. E, se bobear, até mais preocupados do que com como resolver o câncer da corrupção que afeta a Petrobras. Para isso os pobres têm uma solução drástica: os corruptos devem ir para a cadeia e devolver o que foi roubado.

O voto dado à candidata do governo pela humilde classe C foi sem dúvida um reconhecimento aos governos do PT, os dois de Lula e o de Dilma, por tê-la resgatado da miséria, assim como pelo medo infundado, aconselhado pelos marqueteiros, de perder os benefícios sociais se votassem na oposição. Ou será que alguém podia acreditar que uma pessoa como Marina Silva iria trazer de novo a fome e a miséria para o Brasil?

Nas sociedades modernas, o conceito marxista da luta de classes e das divisões entre pobres e ricos, trabalhadores e exploradores, está ultrapassado. Até mesmo os partidos socialistas democráticos e os da social-democracia dizem isso.

Mantém-se em pé a desigualdade social entre os trabalhadores, que não é só econômica, mas também educacional e cultural, e contra ela devem lutar as forças políticas de qualquer cor e ideologia. Mantém-se em pé a tirania hoje exercida pelas multinacionais do dinheiro em todo mundo, criadoras de crises que acabam pondo de joelhos sobretudo os mais desfavorecidos.

Os pobres do Brasil não são hoje os que não têm o que comer, e sim os que não receberam educação e por isso nunca conseguiram um trabalho qualificado que lhes permita ter uma renda digna.

Hoje o lema é a igualdade de oportunidades para todos, algo que só se consegue permitindo que ninguém fique sem uma preparação técnica ou acadêmica. Isso é que os Governos devem assegurar.

Poderia parecer estranho, mas uma decisão como a nomeação do novo ministro da Economia ou da Educação poderia ser até mais importante para os pobres do que para os ricos. Nem nas maiores crises econômicas os ricos acabarão sendo atirados na sarjeta da pobreza. Para a classe C, que começa a sentir o gosto de poder saborear alguns privilégios da classe A e B, ainda que pequenos, basta descer um degrau para se precipitar de novo no inferno da pobreza ou da miséria.

Um ponto a mais na inflação ou na taxa de juros, alguns décimos de crescimento do PIB ou uma menor possibilidade de conseguir um bom emprego são fatores que acabam representando, sem a menor dúvida, a maior tragédia para as classes menos assistidas e economicamente mais frágeis.

Costuma-se alertar os mais pobres contra o perigo das privatizações, contra os empresários e bancos ávidos de lucros. Se eles entendessem de economia, saberiam muito bem que, se quem gera riqueza cruzar os braços, se houver uma guerra contra os mercados, os primeiros a sentirem na pele o açoite da crise seriam eles, pelo simples motivo de serem os mais frágeis.

A classe C não vive de ideologia; vive de sonhos e esperanças que se avivam não com uma economia em crise, e sim com um país crescendo, com suas riquezas mais bem distribuídas, com uma inflação que não lhes faça sair a cada dia do mercado com o mau humor do aumento dos preços, e sem o pesadelo de ir dormir sem saber como pagar suas dívidas ou manter o seu emprego.

No dia em que no Brasil essa classe C entender de economia, os pobres serão mais críticos e inconformistas. Só então os políticos se verão constrangidos a abandonarem seus velhos truques para conquistar ou comprar votos provocando a inútil divisão entre classes, que não interessa hoje nem aos pobres nem aos ricos.

Hoje, a riqueza se gera e se administra entre todos juntos, com um país unido na esperança e no direito a poder defender ideias diferentes.

O velho conselho de “dividir e vencer” carrega em suas entranhas o sabor da guerra. Só unidos em um mesmo abraço solidário, entre diferentes, sem que ninguém possa ser visto como inimigo por pensar de outro modo, os brasileiros reconquistarão seu gosto pela alegria e a amizade, valores que lhes são próprios e que foram tristemente humilhados nas eleições.

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