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A bola rola e os protestos diminuem, mas não se extinguem

As manifestações no Brasil parecem anestesiadas pela Copa do Mundo, mas não desaparecem

Antonio Jiménez Barca
Protesto contra a Copa no Rio.
Protesto contra a Copa no Rio.Mario Tama (GETTY)

Na última quinta-feira, o movimento Passe Livre, que reivindica transporte público gratuito, organizou uma manifestação em São Paulo. O motivo do protesto era simples: comemorar o aniversário das multitudinárias marchas cidadãs que, eles mesmos detonaram a partir da faísca dos aumentos dos preços das tarifas de ônibus e metrô, e que sacudiram o país de cima a baixo. O mundo se voltou, então, para o Brasil, sem entender, a princípio, o sentido de protestos que se resumiam a reivindicar melhores serviços públicos para uma nova classe social. Os gritos contra a Copa do Mundo daquele junho de 2013 pressagiavam um campeonato quente nas ruas.

Mas não está sendo assim. Ou não totalmente. Aproximadamente 1.300 pessoas compareceram à manifestação da última quinta-feira. É verdade que um grupo violento de mascarados fechou uma avenida principal de São Paulo destruindo cabines telefônicas e incendiando lixeiras, e que vários carros de uma loja de luxo próxima amanheceram danificados por pedaços de madeira, ferro e pedregulhos. Mas, também é verdade, que a Copa está acontecendo sem muitas complicações e que a maré de protestos e manifestações que traziam o temor de um campeonato desastroso desapareceu, quase completamente, quando a bola começou a rolar. As ruas e os bares foram tomados por torcedores de todos os países (inclusive os brasileiros) que assistem pacificamente às partidas e falam, quase exclusivamente, sobre futebol, o que dá a impressão de que uma trégua foi firmada, até que a competição termine.

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Os porta-vozes dos movimentos sociais e vários especialistas neste tipo de fenômeno garantem que as queixas continuam, mas que as multitudinárias manifestações com reivindicações abstratas de um ano atrás (melhores serviços públicos, melhor educação, menos corrupção...), incitadas também pela atuação de uma polícia bruta e pouco preparada, se fragmentaram em protestos pontuais com objetivos mais concretos: moradias em determinadas áreas, redução de tarifas do transporte público...

Todos concordam em ressaltar que a maré reivindicativa de 2013 marcou uma linha divisória no país, despertando uma população que não vai mais voltar atrás. "As pessoas entenderam que a ação política não depende de agentes externos, nem precisa de uma organização hierárquica. O tema quente, para o futuro das manifestações será qual modelo de cidade vamos ter", garantiu há alguns dias Lucas Monteiro, integrante do movimento Passe Livre. O mesmo, mas a partir de outra perspectiva, foi dito pelo governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, em uma entrevista recente: "A insegurança urbana e o transporte público serão as chaves da campanha eleitoral", referindo-se às eleições de outubro deste ano, que já estão na boca do povo.

De fato, ainda que o país esteja um pouco narcotizado pela efervescência da Copa do Mundo, há um imenso fundo eleitoral que é irremovível. A presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, do PT, oficializou a sua candidatura no último sábado, prometendo, entre outras coisas, "mais mudanças" e melhorias em temas delicados para o brasileiro de hoje em dia, como educação, saúde pública, e transportes. Ela acrescentou que não se deixará guiar pelo ódio nem pelos insultos. Uma mensagem dirigida àqueles que, no dia da abertura da Copa, na partida entre Brasil e Croácia em São Paulo, a vaiaram e xingaram – a maioria brasileiros de classe média alta, que são os que podem pagar pelos ingressos para os jogos. Rousseff, apesar de ter caído nas pesquisas realizadas nos últimos meses, ainda está na frente dos outros candidatos. E a Copa do Mundo, envolvida por negros prognósticos, ocorre de maneira aceitável, e está servindo, segundo enquetes recentes, para frear a queda da candidata à reeleição e, inclusive, fazer com que ela volte a subir.

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