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Frank-Walter Steinmeier | ministro das relações exteriores da Alemanha

“A Europa deve fazer o possível para evitar a guerra civil na Ucrânia”

O ministro das Relações Exteriores, que se reúne nesta segunda-feira com García-Margallo em Madri, aposta em um papel mais ativo da Alemanha no exterior

Frank-Walter Steinmeier, ministro de Exteriores da Alemanha.
Frank-Walter Steinmeier, ministro de Exteriores da Alemanha.S. Gallup (Getty)

“A Europa deve seguir fazendo tudo o que esteja ao seu alcance para evitar que a Ucrânia afunde na anarquia e na guerra civil, preservando, além disso, sua unidade nacional”, afirma o ministro alemão de Assuntos Exteriores, Frank-Walter Steinmeier (SPD). Em uma entrevista realizada neste domingo 23, por e-mail —pouco antes de uma viagem para Madri para entrevistar hoje seu homólogo espanhol, José Manuel García-Margallo—, o chefe da diplomacia germânica aposta em um papel mais ativo da Alemanha no exterior.

Steinmeier dirige pela segunda vez a diplomacia alemã em uma grande coalizão dirigida por Angela Merkel. Uma de suas primeiras tarefas foi a mediação na Ucrânia. Junto a seus pares da Polônia e França, Radek Sikorski e Laurent Fabius, o ministro se reuniu na quinta-feira e na sexta-feira em Kiev com representantes da oposição e com o então presidente Víctor Yanukóvich. Chegaram a um acordo que foi superado pelos acontecimentos. O Parlamento ucraniano elegeu neste domingo  Alexander Turchínov para presidente em função, e no sábado convocou eleições presidenciais. O ministro alemão prefere não comentar esta mudança de Governo nem quer opinar se Turchínov, braço direito da recém-libertada líder opositora Yulia Timoshenko, será um interlocutor válido. O social-democrata compartilha com Merkel a preocupação pela unidade nacional da Ucrânia e teme a escalada de violência. Embora não haja nenhuma euforia em suas palavras, Merkel e seu ministro felicitaram Timoshenko no domingo.

Pergunta. O fantasma de uma guerra civil tem rondado a Ucrânia nesta semana. É possível enxergar uma solução?

Resposta. A Ucrânia é parte de Europa. O que acontece em Kiev não pode nos deixar indiferentes. As dezenas de mortos e feridos nos fatos violentos de Kiev foram uma tragédia para o país. Os acontecimentos estão passando vertiginosamente nos últimos dias. O esforço europeu de mediação que empreendi em Kiev junto a Radek Sikorski e Laurent Fabius [ministros das Relações Exteriores da Polônia e da França] e em comum acordo com [a alta representante da UE] Catherine Ashton, evitou uma situação dramática. A Europa deve seguir fazendo tudo o que esteja ao seu alcance para evitar que a Ucrânia afunde na anarquia e na guerra civil, preservando, além disso, a unidade nacional do país.

“A mediação da UE evitou uma situação dramática"

P. O que você espera da oposição?

R. Celebro que Yulia Timoschenko esteja em liberdade desde sábado, depois de anos de prisão e de doença. Ela e os demais líderes da oposição têm agora uma grande responsabilidade para o futuro da Ucrânia e para a unidade do país. A situação continua sendo crítica. Precisamos que o Governo de transição possa começar a trabalhar o quanto antes. A vingança não deve determinar o programa político dos futuros líderes em Kiev. Em vez disso, eles devem parar a escalada violenta e buscar o diálogo e o equilíbrio entre as facções políticas e também entre as regiões. O acordo que mediamos Alemanha, França e Polônia, ainda oferece uma via razoável e aceita por ambas partes.

P. Você propôs que a Alemanha assuma um papel mais ativo na solução das crises globais. Está rompendo com a política de seu antecessor?

R. A Alemanha não pode se contentar em discutir a política internacional do lado de fora. Devemos assumir responsabilidades diante do que passa ao nosso redor. Não se trata em absoluto de defender uma militarização da nossa política exterior. Continua sendo correta a política de moderação nas ações militares sempre que esta não seja usada como uma desculpa para não se implicar, seja por mero conforto ou por falta de valor. Vemos como as crises internacionais se aproximam das fronteiras da Europa. Os Estados Unidos são cada vez mais reservados quando se trata de proteger a segurança europeia. Como alemães e como europeus devemos lançar mão de todo nosso arsenal de instrumentos diplomáticos. Nosso sucesso será medido dia a dia segundo a nossa atuação.

“A sede de vingança não deve determinar o programa

P. De concreto o que podemos esperar?

R. Por exemplo, a Alemanha está aumentando seu compromisso europeu em Mali. Enviamos parte da brigada de infantaria franco-alemã a uma missão de treinamento da qual a Espanha também participa. Aceitamos nos desfazer dos restos de armas químicas sírias. Além disso, como dissemos, estamos nos comprometendo ao máximo em busca de uma solução pacífica para a Ucrânia.

P. O projeto europeu perdeu prestígio. Muitos veem a União Europeia como um problema. O que a Alemanha fará para mudar isto?

R. Depois de vários anos de crises, muitos na Europa olham a União Europeia com decepção. Muitos cobram da Alemanha seu papel nessa tarefa. Os defensores da ideia da Europa têm de levantar a voz de olho nas próximas eleições europeias. Um avanço substancial seria deixar para trás a crise dos últimos anos e seguir avançando na integração, principalmente a união econômica e a união monetária. Devemos defender isto com argumentos objetivos e também com entusiasmo. A Espanha é um sócio central neste processo. Apesar da crise, os espanhóis demonstraram-se admiravelmente imunes aos populistas anti-europeus.

P. Há poucos meses, você era chefe da oposição no Bundestag, onde criticava as políticas europeias de Merkel e as chamou de “fracassadas”. O que vai mudar na Europa com o SPD no Governo alemão?

R. Devemos seguir um curso de reformas na Europa que assegure a coesão em nossas sociedades. Por isso, uma de nossas primeiras medidas no Governo foi acordar um salário mínimo em todo o país para todas as categorias. Também queremos progredir na introdução de um imposto europeu para os mercados, em forma de uma taxa para as transações financeiras. Depois dos grandes esforços conjuntos dos últimos anos, chegamos ao ponto em que o horizonte começa a clarear. A Espanha saiu da recessão e também do programa de estabilização bancária. É um grande sucesso, mas pouco antes de chegar a Madri, sei que muitos espanhóis tiveram que fazer grandes sacrifícios. Não podemos deixar que a crise econômica abra caminho para uma crise política na Europa. A Alemanha leva muito a sério sua responsabilidade. Não me refiro só à de acompanhar os projetos reformistas concretizando a estabilidade. Mas também à necessidade de assegurar o apoio dos cidadãos à integração de Europa.

P. A Alemanha vai se abrir a um acordo para constituir a união bancária?

R. É óbvio que precisamos de ações concretas para defender a causa europeia. Encontrar um acordo na união bancária é decisivo. A Alemanha apoia o projeto sem reservas. As negociações estão caminhando em Bruxelas e vejo uma disposição à aproximação das partes.

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