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Irã executa um poeta e outro ativista da minoria árabe

A condenação como “inimigos de Deus” reacende o debate sobre o uso da pena capital para silenciar os dissidentes políticos

Ángeles Espinosa
Manifestação contra uma execução, ante a embaixada iraniana em Londres.
Manifestação contra uma execução, ante a embaixada iraniana em Londres.AFP

Uma nova denúncia de execuções no Irã reacende o debate sobre o uso da pena capital para silenciar os dissidentes políticos, em especial entre as minorias étnicas. Segundo o Centro de Documentação dos Direitos Humanos no Irã (IHRDC, na sigla em inglês), um poeta e defensor dos direitos humanos e outro ativista árabe foram mortos no final de janeiro acusados de “ser inimigos de Deus”, sem que seus advogados fossem avisados ou fosse permitida uma última visita de suas famílias. De acordo com essa organização, já são 55 penas de morte executadas neste ano e 300 desde a chegada de Hassan Rohani à presidência do país, em agosto último.

O IHRDC identifica as últimas vítimas como Hashem Shabaninejad e Hadi Rashedi, dois professores da localidade de Ramshir, no sudoeste do Irã. O primeiro era um popular poeta local e ativista pró-direitos humanos, que, segundo a rede Al Jazeera criticava o tratamento dado à minoria árabe do Irã. Os árabes mal chegam a 3% dos aproximadamente 80 milhões de iranianos, mas são a metade da população da província petrolífera em que Ramshir se localiza e que faz fronteira com o Iraque.

Shabaninejad, de 32 anos, fundou o Al Hiwar (O diálogo, em árabe), um centro para a difusão da cultura árabe fechado pelas autoridades em 2005 e do qual também Rashedi fazia parte. Foi detido há três anos sob a acusação de ser um “mohareb”, uma figura jurídica sem equivalência na legislação internacional que costuma ser traduzida como “inimigo de Deus” e que é castigada com a pena de morte. As organizações internacionais de direitos humanos consideram que se trata de um artifício para silenciar os dissidentes políticos.

Um ano depois, Shabaninejad apareceu na PressTV, a rede iraniana em inglês transmitida por satélite, confessando sua participação em atividades de “terrorismo separatista”. Em julho do ano passado, um tribunal revolucionário o condenou à morte junto com outras 13 pessoas, entre as quais também estavam Rashedi e outros três membros do Al Hiwar, por “ser inimigo de Deus, semear a corrupção na terra, fazer propaganda contra a República Islâmica e atuar contra a segurança nacional”. Seu translado da prisão em dezembro último alertou a Anistia Internacional para o risco de uma iminente execução.

Às dúvidas colocadas sobre o sistema judicial iraniano se soma nesse caso a denúncia de que os responsáveis sequer respeitaram suas próprias leis. Segundo o IHRDC, Shabaninejad e Rashedi foram executados no último dia 27, mas suas famílias não foram comunicadas até dois dias depois. “O código processual especifica que deve ser notificado o advogado de defesa com pelo menos 48 horas de antecedência, e que o réu tem direito a receber visitas antes de sua execução”, se queixa a organização.

Esse dado e o fato de que as famílias só poderiam realizar o funeral em seus domicílios e durante 24 horas, em local de em uma mesquita e durante os três dias como de costume, reforçam a ideia do caráter político de seu caso. Outros quatro membros de minoria árabe foram executados um mês antes.

No ano passado, Teerã executou 624 pessoas, uma centena a mais que em 2012, o que suscitou a preocupação das organizações de direitos humanos. De fato, na contramão do esperado, a eleição de Rohani não se traduziu em uma menor aplicação da pena capital. Ao invés disso, várias organizações falam de um acréscimo e o IHRDC assegura que desde que assumiu a presidência em agosto pelo menos 300 pessoas tenham experimentado o mesmo destino. 

Esses dados convertem o Irã no país com o maior número de execuções per capita. O relator especial da ONU para o Irã, Ahmed Shaheed, pediu às autoridades que freiem sua aplicação. A maioria está vinculada ao tráfico de drogas. Mas os grupos de defesa dos direitos humanos asseguram que a pena de morte também é usada para calar a dissidência política, em especial entre as minorias étnicas.

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